Wilton Santana
Quando do meu doutoramento na Unicamp, entrevistei os treinadores que, até aquele momento, conquistaram a Liga Futsal: Ferretti, Mussalém, Lucena, PC, Miltinho e Jarico. O tema foi aspectos estratégico-táticos do nosso jogo. Isso já faz algum tempo, mas, volta e meia, recorro aos achados daquela tese para compreender e ensinar futsal.
E foi assim dia desses, quando de uma aula sobre aspectos táticos do jogo ofensivo, para a qual resgatei alguns indicadores reportados por aqueles treinadores sobre “o que consideravam indispensável para que o ataque fosse eficaz”. Eficaz é o ataque que é efetivo. E efetivo é o ataque que faz gols. Ponto.
Dentre outros indicadores, como os de “imprimir movimentação constante”, “fazer a bola andar”, “dar apoio ao portador da bola”, “ganhar as costas do adversário”, “ter uma bola parada de qualidade”, etc., me chamou a atenção, mais uma vez, o de “ter jogadores habilidosos e criativos” para que a coisa toda funcione. É isso! Ou seja, por mais organização que os treinadores possam imprimir ao processo ofensivo, construindo, de jogo a jogo, a identidade coletiva e singular da equipe, é preciso que os jogadores “rompam essa ordem” para que o ataque dê resultado. Romper a ordem significa improvisar, dar soluções criativas aos problemas do jogo, fazer o que não se espera.
Criatividade contextualizada
Antes que alguém infira que estou relativizando a organização e fazendo apologia ao jogo centrado na habilidade e na criatividade do jogador, e/ou na anarquia tática, e/ou na desorganização, deixo claro: o treinador nunca desiste da organização, de treinar os princípios táticos da sua equipe, da missão coletiva, não só porque seu time “tem de jogar como um time”, mas também e, sobretudo, porque aquela favorece as decisões do jogador. É isto mesmo: a organização, sendo o antídoto para se enfrentar o caos do jogo, cria um cenário promissor para que o jogador decida e, segundo o sentido deste texto, decida rompendo a ordem, decida criativamente. Nunca é demais lembrar que a criatividade tem uma relação direta com eficácia, que tem a ver com efetividade. O jogador criativo é o que age com originalidade, que tem um comportamento flexível e que obtém vantagens competitivas para a sua equipe. Portanto, jogadores criativos não são os que fazem o que querem independentemente do sentido coletivo do jogo que a sua equipe desenvolve. Ao contrário: criam num contexto específico, imersos na forma de a equipe jogar. Trata-se de uma criatividade contextualizada.
“[…] o ataque não prescinde da organização, mas precisa de que “os jogadores sejam jogadores”, isto é, de que improvisem, arrisquem, tomem conta do jogo, assumam o protagonismo, rompam a ordem com sua habilidade e criatividade.
Ordem e desordem
O treinador precisa planejar o treino, intervir no “aqui e agora”, investir na qualidade da informação, criar as regularidades táticas que pretende ver na sua equipe. Mas o jogo se dá na interface entre a ordem e a desordem, a organização e a auto-organização, a uniformidade e a variedade, a previsibilidade e a imprevisibilidade. Se fosse só uma coisa ou outra não seria jogo! O raciocínio, portanto, é outro: o ataque não prescinde da organização, mas precisa de que “os jogadores sejam jogadores”, isto é, de que improvisem, arrisquem, tomem conta do jogo, assumam o protagonismo, rompam a ordem com sua habilidade e criatividade. Esse é o sentido por trás do discurso dos treinadores peritos da minha pesquisa.
Por isso que os melhores times são os organizados com jogadores criativos; além de serem altamente competitivos, ganham títulos e encantam! Por isso que os times organizados com jogadores comuns, embora competitivos, dificilmente ganharão títulos. Por isso que os times desorganizados com jogadores criativos precisam, urgentemente, de treinadores. Por isso que os times desorganizados com jogadores comuns “não vale a pena ver de novo”.
Wilton é treinador nível 3 CBFS.
13 Comentários
A diferença é perceber que organização não significa inibir a criatividade, precisamos de jogador que improvise e assuma responsabilidade de ser protagonista. Parabéns pelo tema.
Muito bom Professor!
Parabéns pelo conteúdo apresentado e obrigado por sempre compartilhar conhecimentos conosco.
Muito interessante preservar a criatividade com um mínimo de organização….parabéns por abrir esse debate. Abraço.
Equipes de EXTRA OFICIAL X EQUIPES ORGANIZADAS, nunca a equipe de extra , com jogadores muito criativos, fizeram ameaça de pertubar as equipes federadas, estas ,sempre dentro duma ordem ,deixavam a equipe da desordem ( jogadores criativos) em frangalhos.
Só acho que pra concordar com vc a ordem é premissa e aí sim … vem a desordem!
É isso aí, Batata! O ataque não prescinde da organização, mas precisa da criatividade para funcionar. Abraços!
Parabéns pelo texto! Acredito que a individualidade se potencializa através da organização, pois aumentam as chances de tomar a decisão correta dentro um jogo construído e pautado em conceitos!
Valeu, Eduardo!
Belo texto, jogo livre organizado! Parabéns pela reflexão.
Valeu, Marquinhos! Isso reflete o que
penso desse seu atual time: jogam livre um jogo organizado. Abraços
Com muita certeza a improvisacao gera o inesperado ,juntando a organização ofensiva com a defensiva pra que a equipe não tome ações inesperadas de contra ataque ,forma se equipes diferentes umas das outras e ali mostrasse a eficácia de uma equipe vencedora !
Obrigado pelo texto professor
Valeu, Betinho!
Boa. Porém entendo que o gol nunca sai por acaso, o gol é fruto de trabalho e não de um insight momentaneo! Sempre busco orientar minhas equipes a buscarem RUPTURAS, este sim é o objetivo do ataque e o beabá dos gols!
Mais um grande texto,escrito com a realidade do nosso jogo! Fugindo dos padroes apenas teoricos e os alinhando a pratica!