Wilton Santana
Antes de começar a treinar futsal, aos 11 anos de idade, tarde para o padrão atual, brinquei muito de bola na rua. Foi isso que me deu condições de ser selecionado para o futsal, pois naquela época não havia as chamadas escolinhas. Quando saí do futsal para o futebol, aos 15 anos, tinha um bom nível de jogo. Tanto que fui convocado para a Seleção Brasileira Sub-16 e fui parar nos juniores do C.R. Flamengo. Mais adiante, deixei o futebol e retornei para o futsal, então com 20 anos. Joguei ainda alguns campeonatos paranaenses e tal, mas nunca mais fui o jogador de futsal que me levou ao futebol. Isso sempre me intrigou.
O que aconteceu comigo presenciei amiúde com vários jovens: migraram do futsal para o futebol porque se destacaram e, quando retornaram, nunca mais mostraram o desempenho que os levou para a grama. Perderam, por assim dizer, o timing, o ritmo, a dinâmica do seu jogo no jogo de futsal.
Por que disso? Não sei. Complexo. Poderia ser porque o jogo de futsal que praticavam mudou, pode ser por falta de motivação, pode ser por esses e outros tantos fatores misturados. Ou seja, qualquer resposta, por mais elaborada que seja, ficaria incompleta. Ainda que ouvíssemos os jogadores que passaram por isso, por exemplo, a partir de uma pesquisa qualitativa rigorosa, permaneceria incompleta. E não haveria problema. A incompletude não me incomoda. Nem a incerteza. A sorte. O acaso. O abstrato. O intangível. O etéreo. Não sou estatístico.
“(…) a pedagogia do treinador de futebol mal preparado interrompe o aprendizado do jogador de futsal bem treinado, que é quem interessa para o campo, e isso em curtíssimo prazo. Em longo prazo, o aniquila”.
A suposição que levantarei, entre outras possíveis, é a de que a pedagogia de um certo tipo de futebol, dada ao simplismo, à uniformidade, à separação, às repetições de nada para lugar nenhum, fragiliza os jogadores de futsal bem treinados em curtíssimo prazo. Em longo prazo, desalinha-os. Deforma-os para sempre. O fato é que esse jogador, acostumado a tomar decisões desde os 6 anos de idade, em franca ascensão tático-técnica aos 11, 12, habituado a resolver problemas enquanto treina, insere-se nas práticas de certo tipo de futebol que interrompem o seu aprendizado. Desfecho: o jogador que aprendia, que progredia, não só deixa de evoluir, como regride. Preste atenção no ciclo: aprender, progredir, interromper, regredir. Não se trata de estagnação. É muito mais sério: inclui perdas e danos!
Isso não pode ser reputado aos bons treinadores de futebol de jovens, que estudam a pedagogia do futebol contemporânea, assentada na complexidade, na diversidade, na junção das partes e elaboram contextos de exercitação tática que potencializam os jogadores. Esse tipo de treinador de futebol pulverizou o mito do dom, incinerou os manuais técnicos e ficou livre para estudar pedagogia do esporte e fazer do treino a fonte do aprendizado. Nesse caso, o ciclo para o jogador é promissor.
Antes que me esqueça: não quero passar a impressão de que os treinadores de futsal de crianças e jovens são melhores do que os de futebol. Há muita gente incompetente nas quadras, ensinando futsal como se ensina natação, colocando as crianças em fila para repetir e memorizar técnicas, com um conceito de talento do século passado, desorientando gerações de iniciantes. Mas quero ratificar que a pedagogia do treinador de futebol mal preparado interrompe o aprendizado do jogador de futsal bem treinado, que é quem interessa para o campo, e isso em curtíssimo prazo. Em longo prazo, o aniquila.
Wilton fez o mestrado e o doutorado em educação física na Unicamp (SP).
3 Comentários
Acredito que o que falta tanto para os profissionais de futsal, bem como para os de campo, é propiciar uma metodologia que faça com que o educando, assimile de forma conceitual os fundamentos, orientados para a resolução de situações-problemas, contribuindo para a elevação da auto-estima, de uma corporeidade lúdica e acima de tudo contribuindo para a melhoria de uma leitura de jogo contemporânea. permitir com que o aluno-atleta possa tomar decisão, seja numa sequência de dribles, passes ou fintas. Observo, não somente no campo , mas também no futsal de alto rendimento a limitação de atletas profissionais, que baseiam seu jogo numa sistematização de passes, muitas vezes sem dar a continuidade no jogo pela deficiência na trajetória de bola. É claro pela quantidade de equipes e por consequentemente uma maior quantidade de jogadores no campo isso fica muito mais evidente. Trabalho com futsal e campo durante 32 anos, e sempre trabalhei a iniciação até 10 anos e 11 meses somente no futsal, realizando algum processo de pré-adaptação através de eventos competitivos e amistosos em mini campos (campo dividido em 8 partes), onde os alunos-atletas utilizavam-se de todos os fundamentos, aspectos táticos e técnicos do futsal. Acredito que quanto tivermos nas equipes profissionais de futebol, algo similar o Brasil terá um aumento significativo na qualidade de seus atletas da base no campo.
Wilton, esse panorama acontece também com os profissionais! É nítido, ao meu ver, em algumas equipes que trabalhei assim como em algumas equipes que eu indiretamente acompanhava o treinamento e o estado de treinamento dos jogadores, que a mudança repentina, de uma metodologia sistêmica, baseada na contextualização dos exercícios para resolução de problemas, de modo aberto, para uma metodologia que privilegiava movimentos pré estabelecidos, repetições de gestos técnicos e treinos prioritariamente analíticos, provocava uma regressão significativa no desempenho dos jogadores em um prazo curtíssimo. A sustentação de um estado ótimo de percepção – tomada de decisão – ação, para um jogador de futsal/futebol é frágil, extremamente suscetível á interferências negativas quando alteramos o ambiente de treinamento dessa forma. Sem contar que nos dias de hoje, os jogadores estão melhores informados sobre os binômio treino – desempenho e determinados exercícios não estimulam o jogador à manter-se concentrado e transformar aquelas informações que está recebendo em memórias que irão ajudá-lo nos futuros processos de tomada de decisão.
Entendo o que diz professor e já pensei sobre o futebol e o futsal, aliás, o futebol e os esportes coletivos de quadra, na média, o futebol tem profissionais menos preparados, inclusive nas equipes adultas. Pelo futebol ser o que é diante da mídia, pelos valores que movimenta, tenho a impressão que a soberba chega a alguns profissionais, gosto de uma frase dita por Paulo Autuori em uma aparição no programa Bola da Vez- ESPN: ” O futebol permite tudo, as vezes vc faz tudo certo e perde, as vezes faz td errado e ganha”…pq digo isso, alguns comandantes, referências de títulos no campo não me passam a segurança de conhecimento tático, a grande maioria parece ser mais um motivador, gerenciador de grupo, não que isso não seja necessário, mas poucos parecem vencer por implementar as suas equipes movimentações diferentes, padrões de marcação ou de circulação da bola diferentes e assim é na base. Os comentaristas pedem a td momento ex-atletas comandando as equipes de base e a maioria desse caras reproduzem o que aprenderam a décadas atrás, hoje, crendo que o futebol é simples, não precisa mudar, em contra partida, temos profissionais de educação física (que não ogaram profissionalmente) que são incapazes de proporcionar algo realmente pensado e evolutivo para as crianças da base, falo isso por conversar muito com colegas de Pós-Graduação em Futebol e Futsal (em 2012 fui seu aluno) e perceber que eles estavam um grau acima do senso comum, mas a cabeça era a msm do senso comum. Me recordo de um colega que dizia que o Santos ia jogar de igual pra igual com o Barcelona sim! Não acreditei que não estava levando em consideração que o ano era 2011, um ano após o título mundial da Espanha e aquele Barça tinha 7 campeões mundias ainda em alto nível, mais o melhor do mundo e Dani Alves na lateral direita, tendo vencido na final da Champions com propriedade de 70% de posse de bola, o poderoso Manchester United de Rooney. Ou seja, o Santos teria isso pra menos de posse bola, tendo apenas um garoto que começava a carreira na seleção brasileira e o pior, creio que o Muricy tbém achava, pois em 6 meses não preparou o Santos para ter um desempenho melhor, não falo de resultado, 4 x 0, perfeitamente normal, mas da forma que foi..podia ter tomado 8. Mas esperar o que de um treinador que ao escrever o prefácio do livro do Bruno Pivetti, Periodização Tática disse ter conhecido ali o assunto. O futebol senta no seu “profissionalismo” e não auxilia em nd as outras modalidades, enquanto eles, se fossem mais humildes tinham muito a aprender com o futsal, basquete, handebol, entre outros. Desculpe o textão professor, mas esse atraso do futebol me incomoda e muito! E qdo, alguém faz algo pensado, como um escanteio curto em que 2 jogadores na bola tiram 2 marcadores da área, diminuindo a vantagem numérica da defesa dentro da área, mas dá errado..o comentarista, ex jogador ou não, vem e diz que não gosta de escanteio curto, eles gostam das 10 tentativas de bola alçada direto para sair um gol, quando sai! Abç professor!